Quem sou eu

Eu sou nascido e criado na região da Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais. Tenho alguns anos de vida, sou casado com Jandira e tenho um filho chamado Migué, de doze anos. Aprendi a ler e escrever e como gosto muito de falar, me convidaram pra trabalhar na Rádia Sucesso. Meu pograma é de 5 até 8 da manhã, todo santo dia, de menos o domingo. Dispois da rádia, você pode me encontrá na roça cuidando das minhas coisa.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Como essa gente é criativa



Quando eu assisto um filme bom, leio alguma coisa bem escrita ou vejo uma novela das boas, fico pensando como é que podem ter tanta criatividade.

De onde tiram tanta ideia...eu acho que já sei. É da vida. Não tem coisa mais criativa que a própria vida. O segredo deve ser observar as coisas, os detalhes, as caras das pessoas, o jeito delas conversarem, as coisas que fazem e as histórias que todas elas têm pra contar.

O difícil é saber observar e valorizar o detalhe, acompanhar com curiosidade a maravilhosa diferença que cada pessoa tem da outra.

Por isso, vou reproduzir aqui uma pequena vivência que eu sei muito bem do que se trata.

Dois amigos, no final da década de 70, trabalhando numa rádio pequenininha do interior, ganhando, os dois, a maior mixaria. Nem salário mínimo eles recebiam, tirando os descontos que sempre vinham.

Um deles não tinha mais pai, nem mãe. O outro até hoje tem os dois, graças a Deus. Um deles morava de favor na casa de um irmão. O outro fazia faculdade e tinha os pais a forçar para que ele estudasse. Um deles tinha um monte de gente a aconselhar... larga isso, vai trabalhar numa coisa que te sustente, criatura... vai capinar umas roças. Os dois conheciam muito bem a roça, as pessoas simples. Os dois eram inteligentes, foram fazer teatro amador pra ganhar nada. Os dois sonhavam em ir pra cidade grande, trabalhar na televisão.

Os dois, um dia, arrumaram suas namoradas e se casaram no final da década de 80. Os dois são padrinhos de casamento um do outro. Um deles é padrinho do filho do outro. Os dois já passaram um monte de sufoco juntos.

Um dia, numa época de vacas muito magras, os dois estavam fazendo uma reportagem na Exposição Agropecuária e almoçavam de graça por conta da prefeitura. Junto deles, um técnico da rádio reclamava da comida. Enquanto o técnico falava, os dois engoliam o feijão com farofa achando que ia sumir. De repente, um deles, o sem pai nem mãe, diz uma coisa pro técnico:

- Pensa numa coisa... imagine se Deus virasse para você, agora, e dissesse: - meu filho, todos os dias de sua vida você terá esse prato de comida, por minha conta...nunca esse prato vai lhe faltar... pensa nisso.

Silêncio na mesa. O sujeito entrou a comer, calado, sem nunca mais reclamar, pelo menos na frente deles.

Outro dia, um deles, o órfão, estava, por sua vez reclamando da vida: ganhava quase nada, não tinha onde morar, estudava à noite e gastava quase todo seu salário pagando colégio. Casaco de frio, um só, na geladeira que era aquela cidade. Para comer, tinha de ser em troca de propaganda de um restaurante famoso.  Era pra reclamar, a situação era ruim. O amigo dele, inseparável, teve sua vez de lucidez e disse:

- Pensa... a sua situação não pode piorar! Veja só se é possível piorar. Pensa. Só se você for morar na rua e por enquanto, ainda tem a rádio pra você dormir, ganhando um adicional no salário pra tomar conta disso aqui que já foi roubado duas vezes (era essa a situação no momento e o parceiro noturno do sujeito era um rato que morava lá).

De novo aconteceu aquele silêncio esquisito, aquele instante sem resposta, só que dessa vez foi ele quem ficou sem saber o que falar e só concordou depois de uma pausa:

- Verdade, não pode piorar... caramba, nunca pensei nisso.

De fato, as coisas para ele melhoraram e muito, no decorrer dos anos. Tudo deu certo, nada sem sacrifício, mas pelo que eu sei, hoje está bem casado, tem três filhos, uma menina quase médica, os meninos já entrando na faculdade... vive muito bem.

Na verdade, a história desses amigos dava um livro, uma novela, um filme, tudo muito criativo. Criativo nada, seria só contar as histórias que eles têm. São muitas, um monte. Só pra fazer uma sequência, um deles, que hoje mora em São Paulo, tem um filho entrando na faculdade também, quase aposentado, fez uma lista de palhaçadas que viveram juntos, com suas esposas, filhos, amigos e colegas de rádio.

Dizem que não dá pra saber se foi na rádio, no teatro, na televisão, na advocacia, nas viagens malucas a todos os festivais de música da Globo nos anos 80, nos bailes e nas paqueras malucas, não dá pra saber onde e quando eles mais deram risada da vida, mas riram e riram e, segundo a lenda, ainda dão risada das coisas mais sem graça e muitas vezes das mesmas coisas.

Um deles tem uma frase que diz assim: - a gente é que nem galinha... toma no #&* e ainda sai cantando.

Essa história é só pra dizer que quando a gente vive observando as coisas, escrevendo capítulos todos os dias, rindo e chorando deles com vontade, fica fácil escrever uma novela das 9. É só achar um com paciência pra escutar e colocar no papel os personagens que se misturaram na vida deles e que são ótimos também.

Um deles me disse que vai fazer uma lista das pessoas que participaram disso tudo, sem colocar nomes, só o jeitão... ah... vai ser de rir e de chorar.

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